Dados do Trabalho
Título
TERAPIA COM CELULAS TRONCO MESENQUIMAIS DO TECIDO ADIPOSO MELHORA A CONTRATILIDADE VESICAL E REDUZ O RESIDUO MICCIONAL
Introdução e Objetivo
Hipoatividade detrusora ( HD ) é um diagnóstico baseado avaliação urodinâmica completa, geralmente com sinais e sintomas relevantes, caracterizados por baixa pressão do detrusor ou contração de curta duração do detrusor com baixo fluxo urinário, resultando em esvaziamento prolongado da bexiga e/ou falha em atingir o esvaziamento completo da bexiga dentro de um intervalo de tempo normal. 1Associa-se com obstrução infravesical, envelhecimento, doenças neurológicas, síndrome metabólica e diabetes mellitus . A presença de hipoatividade detrusora também pode estar associado a resultados operatórios insatisfatórios e portanto, é essencial identificar os pacientes com essa condição para melhorar os resultados tratamento cirúrgico de hipertrofia prostática2. O método para avaliar e diagnosticar a Bexiga hipoativa é o estudo urodinâmico. Os critérios variam, mas os valores de fluxo máximo < 15 ml/s ( Qmax ) e pressão detrusora no fluxo máximo < 30 cm H2O( pdet Qmax), são considerados os mais importantes no diagnóstico. Além desses, o cálculo do Indice de contratilidade detrusora (BCI = pdetqmax + 5 x Qmax) resultado em escore < 100 permite classificar em detrusor hipoativo3. Recentemente o uso de células tronco para reparar órgãos e tecidos está surgindo como alternativas promissoras no manejo de patologias urologias. As pesquisas estão focadas no uso de células-tronco multipotentes na fase de reparo tecidual. Shin et al, 2020 estudou hipoatividade vesical em ratos diabéticos e encontrou degeneração muscular, infiltração de mastócitos, fibrose e apoptose. O transplante de CTM melhorou a função vesical, incluindo alterações funcionais e avaliação histológica com poucos resultados adversos.5 Portanto, há uma forte necessidade clínica de terapias alternativas para esses procedimentos reconstrutivos, dos quais a engenharia de tecidos baseados em células-tronco é considerada a estratégia futura mais promissora.
Método
Um paciente de 74 anos, do sexo masculino, branco, com história de jato urinário fraco e intermitente, micção muito prolongada, hesitação, sensação de esvaziamento incompleto, dor e abaulamento em hipogástrio foi encaminhado para o Serviço de Urologia do Hospital Universitário Maria Aparecida Pedrossian (HUMAP). A história prévia relatava infecção urinária de repetição e uso de sonda vesical de Foley por retenção urinária há um ano. O paciente não tinha história de tabagismo, etilismo, comorbidades e/ou uso de medicamentos. No exame físico, apresentava genitália externa normal, abdômen com abaulamento e dor na região hipogástrica. O exame digital retal revelou próstata < 30 gramas, sem nódulos e indolor. O hemograma e coagulograma estavam normais. A ultrassonografia demonstrou rins normais, bexiga com resíduo miccional acentuado e próstata de 20 gramas. A uretrocistoscopia era compatível com uretra peniana, bulbar e membranosa normais; uretra prostática normal; colo vesical aberto; meatos ureterais tópicos e paredes vesicais lisas e sem trabeculações. O paciente foi submetido ao Estudo Urodinâmico para avaliação da disfunção miccional. A Urofluxometria inicial não desencadeou micção e apresentava resíduo miccional de 1800 mL aferido por sondagem vesical. Cistometria diferencial demonstrou Capacidade Cistométrica máxima (CCM) de 800 ml, Complascencia Vesical de 77 mL/cmH2O, sensibilidade diminuída, não apresentou perdas com manobras de esforço e ausência de contração não inibida do detrusor. O Estudo Fluxo-pressão apresentou fluxo máximo (Qmax) de 3 ml/s, Pressão Detrusora no Fluxo Máximo (pdetqmax ) de 8 cmH2O, volume urinado de 267 mL, Índice de Contratilidade Detrusora (Bladder contratility índex: BCI = pdetqmax + 5 x Qmax) de 23. Os valores obtidos com esse estudo urodinâmico são compatíveis com Hipoatividade Detrusora (Tabela 1). Foi aplicado o questionário ICIQ-SF (International continence on incontinenca questionaire – Short Form) para avaliação de qualidade de vida com escore foi 17 (Tabela 1). O tratamento padrão para caso de Hipoatividade detrusora foi instituído com cateterismo intermitente limpo. O volume máximo em cada drenagem era de 400 mL. Realizou-se acompanhamento periódico com diário miccional. O paciente foi recrutado para tratamento com células tronco mesenquimais (Parecer consubstanciado CEP/CONEP número #2.745.746). Após concordância e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido o paciente foi submetido à coleta de gordura periférica da face interna da coxa direita e esquerda por de lipoaspiração. O procedimento foi realizado por médico especialista em Cirurgia plástica, em regime ambulatorial. Utilizou-se 125 mL de solução anestésica contendo lidocaína 20% sem adrenalina, soro fisiológico 0,9% e bicarbonato de sódio 8,4%. Foram retirados 200 mL de solução e enviado para Centro de Estudos em Células Tronco, Terapia Celular e Genética Toxicológica (CeTroGen). O material foi processado segundo o procedimento operacional padrão em vigência (Pesarini et al., 2018). Após 60 dias, o paciente foi submetido a Uretrocistoscopia em regime ambulatorial para o transplante de 2 x 106 células tronco mesenquimais. O transplante foi realizado em 5 pontos no corpo da bexiga acima do trígono vesical. Um segundo transplante foi realizado 30 dias após o primeiro seguindo os mesmos princípios. O paciente foi acompanhado clinicamente durante e após o transplante e submetido ao exame de urina com cultura. O paciente não apresentou nenhuma complicação e os exames estavam normais. Após 60 dias do transplante o paciente realizou novo Estudo Urodinâmico. A Urofluxometria inicial mostrou fluxo máximo de 10 ml/s, fluxo médio 5 ml/s, volume urinado de 176 mL e resíduo de 800 mL. A Cistometria diferencial demonstrou Capacidade cistométrica máximo de 550 mL, complacência vesical de 36,6 mL/H2O, sensibilidade diminuída com ausência de perdas e de contração detrusora involuntária. O Estudo de Fluxo-pressão apresentou fluxo máximo de 11 mL/s e pdetQmax de 35 cmH2O. O volume urinado foi de 524 mL e o BCI atingiu 90 (Tabela 1). Quando submetido ao questionário ICIQ-SF o escore atingido 8 (Tabela 1).
Resultados
O hipoatividade detrusora trata-se de uma disfunção miccional caracterizada por fluxo urinário baixo, pressão detrusora diminuída ou de curta duração que leva esvaziamento incompleto da bexiga. O diagnóstico requer avaliação clinica, ultrassonografia de aparelho urinário, uretrocistoscopia para o devido diagnóstico diferencial de causas de sintomas do trato urinário inferior. O padrão ouro para confirmar esse diagnóstico é o estudo fluxo pressão realizado durante o estudo urodinâmico que evidencia fluxo máximo < 15 ml/s e pdet < 30 cmH2O ( 1,3 ). O paciente apresentava idade médica compatível com diagnostico de hipoatividade vesical visto que até 48% dos pacientes acima dos 70 anos e até 28% dos homens com menos de 65 anos podem apresentar hipoatvidade detrusora ( 2,4 ). Os sintomas apresentados são compatíveis com hipoatividade vesical e o paciente desenvolveu episódios de retenção urinária e infecção urinária de repetição devido ao resíduo pos miccional elevado. O formulário ICIQ-SF revelou alto impacto na qualidade de vida devido a alta pontuação encontrada: 17 numa faixa de variação 0 a 21 ( 1 ). A ultrassonografia realizada demonstrou próstata pequena e resíduo pós-miccional elevada. A uretroscistoscopia demonstrou que não havia obstrução do trato urinário inferior por estenose de uretra e o colo vesical estava aberto. O estudo urodinâmico realizado demonstrou no estudo fluxo-pressão fluxo máximo de 3 ml/s e pdetqmax de 8 cm H2O. O BCI calculado foi de 23, bem abaixo de 100 que já caracteriza bexiga hipocontrátil ( 4 ). O paciente foi tratado com medidas conservadoras tais como cateterismo intermitente limpo e vigilância quanto a função renal e infecção do trato urinário 7. Além do tratamento padrão, o paciente foi recrutado para tratamento com células tronco mesenquimais autólogas. Após a coleta de 200 ml de lipoaspirado da face internada da coxa, esse material foi encaminhado para o laboratório Cetrogen para extração e cultivo de CTM. Aproximadamente 60 dias após a coleta da gordura, a cultura atingiu 2 x 106 colonias de CTM. O paciente então recebeu transplante de CTM através de injeção intravesical com agulha endoscópica própria durante o procedimento de uretrocistoscopia ambulatorial. Foram realizados dois transplantes com intervalo de 30 dias. Permaneceu em acompanhamento clinico e não apresentou reações após o transplante. Após 60 dias do transplante o paciente foi avaliado clinicamente e referiu melhora da função miccional, jato urinário e do volume urinarido. O escore do formulário ICIQ-SF caiu de 17 para 8 ( 1 ) . O estudo urodinâmico realizado após o tratamento demonstrou aumento de fluxo máximo de 3 ml/s para 11 ml/s. A pressão detrusora no fluxo máximo aumentou de 8 cm H2O para 35 cm H2O. 0 BCI nesse estudo atingiu 90 caracterizando boa contração detrusora (2,4 ). O paciente estava satisfeito com a micção e estava esvaziando a bexiga normalmente. Foi orientado a manter o Cateterismo intermente limpo duas vezes ao dia. Permanece em acompanhamento ambulatorial.
Conclusão
A HD é uma doença com poucas opções de tratamento cujos os princípios se baseiam em esvaziar a bexiga, diminuindo resíduo pos-miccional e o dano ao trato urinário superior. Atualmente não existe nenhum tratamento que possa regenerar a bexiga e devolver a capacidade contrátil do órgão. O transplante de células tronco mesenquimais autólogas demonstrou ser uma opção viável uma vez que o paciente recuperou a força contrátil da bexiga conforme demosntrou o estudo urodinâmico através dos paremetros de fluxo máximo e pressão detrusora no fluxo máximo com melhora do BCI.
Área
Disfunções Miccionais: IU / Urologia Feminina / Uroneurologia / Urodinâmica
Instituições
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - Mato Grosso do Sul - Brasil
Autores
Henrique Rodrigues Scherer Coelho, SILVIA CORDEIRO DAS NESES, JOVINO NOGUEIRA DA SILVA MENEZES, ANDREIA CONCEIÇÃO MILAN BROCHADO ANTONIOLLI-SILVA, RODRIGO JULIANO OLIVEIRA